O passado voltou com uma roupa diferente
O passado voltou com uma roupa diferente: Este texto é baseado em vivências reais, mas o nome é fictício.
Manu, uma mulher de quarenta e poucos anos, carrega um histórico de relacionamentos tóxicos. Ela sempre atraiu homens indisponíveis emocionalmente e controladores, contudo, há um traço comum entre todos os seus ex parceiros: a escassez financeira.
Vou explicar sobre essa escassez: havia casos em que o cara tinha um cargo razoável, mas era sempre endividado, totalmente descontrolado financeiramente. Havia também os que não tinham nenhuma ambição, e que censuravam o sucesso de Manu, chamando-a de gananciosa.
De uma forma ou de outra, ela não sabia o que era lidar com um parceiro próspero, era comum ela bancar viagens de namorados porque eles nunca tinham como pagar as próprias despesas. Também era comum ela pagar dívidas dos ex, emprestar cartão de crédito e financiar carros em seu nome para eles, o que lhe acarretou sérios prejuízos.
Manu poderia ser diagnosticada com a síndrome da salvadora, ou seja, aquela mulher que atrai parceiros que não tem nada a oferecer, mas ela acredita que, se ela se esforçar o suficiente, vai conseguir colocar esses homens no prumo. Além da escassez financeira, os ex de Manu tinham outros traços complicados: eram rudes, ciumentos e pouco ou nada afetuosos.
Após muitas decepções, Manu se viu cansada e buscou ajuda especializada, investiu em psicoterapia. Essa decisão veio em pleno luto por uma ruptura de um namoro em que ela era a provedora financeira. Era uma relação cheia de idas e voltas e, que em algum momento, o parceiro a trocou por outra. Na terapia, Manu identificou que seus relacionamentos eram o reflexo das suas crenças e de seu senso de merecimento. Ela não se sentia à altura de um homem afetuoso e próspero. Ela acreditava na ideia de “salvar” um homem do fundo do poço para que ele pudesse sentir um pouquinho de gratidão por ela e, quem sabe, dar-lhe umas migalhas de afeto.
Com poucos meses de terapia, Manu decidiu que estava pronta para recomeçar a sua vida amorosa. Em seu entendimento, ela faria tudo diferente dali em diante.
Sentia-se pronta para impor limites e escolher parceiros que fossem o oposto dos anteriores. Ela abandonou a terapia e, em seguida iniciou um novo romance. Manu estava empolgada, afinal, o novo candidato era bem-sucedido, com um alto cargo público. Ela pensou: “que maravilha, finalmente, acabou a fase das vacas magras. Vou poder frequentar restaurantes e viajar com tranquilidade, esse homem tem a grana dele, eu tenho a minha, então vamos desfrutar”.
Manu não fazia ideia da arapuca que ela estava se enfiando. O passado estava voltando com uma outra roupa. Era um namoro à distância. No primeiro encontro deles, ele a recebeu de chinelo, bermuda e camiseta surrada, nem se deu ao trabalho de fazer a barba, enquanto ela foi toda deslumbrante e cheirosa.
Naquele mesmo dia, ela teve que pagar o jantar deles, sozinha. Lembrando: o cara tinha dinheiro, e ela gastou horrores com os preparativos da viagem. Ah, ia me esquecendo: ela pagou o jantar e a estadia no hotel. Ele havia prometido dividir a hospedagem com ela, mas depois desconversou e deixou nas costas dela.
O namoro durou alguns meses, mas a Manu sempre se doando mais e recebendo migalhas. Chegou num momento em que ela rompeu porque se deu conta de que o passado estava se repetindo. Na semana seguinte a do rompimento, ela retornou à psicoterapia. Manu relatou toda a sua frustração em relação ao último parceiro e perguntou à terapeuta: “onde eu errei? Eu fiz tudo diferente dessa vez, escolhi um homem que não tem problemas financeiros, mas vivi uma escassez pior do que com os meus ex endividados”.
A psicóloga respondeu: a escassez se manifesta de várias formas na vida de uma pessoa, Manu. Há casos em que a pessoa não se permite ganhar dinheiro; há casos em que a pessoa ganha bem, mas não sabe administrar, e há casos em que a pessoa ganha muito dinheiro, mas não se permite usufruir dele. Exemplo: a pessoa ganha 30 mil, mas vive como se ganhasse um salário mínimo, o padrão de vida dela está sempre incompatível com a renda. A pessoa tem pena de comprar uma comida que gosta; não viaja, não se veste bem, etc. Ela apenas acumula dinheiro, mas a essência vibra na escassez e na avareza. Por fim, Manu entendeu que ainda não está curada. Ela continua atraindo parceiros com o mesmo padrão, eles apenas mudam de “roupa”. Dessa vez, ela não está com pressa de partir para outra. Ela está comprometida com a própria cura.
Manu cansou de andar em círculos.
Ivonete Rosa
