Me ensine a dançar novamente

Me ensine a dançar novamente

“Onde você estiver não se esqueça de mim… Mesmo que exista outro amor que te faça feliz

Se resta em sua lembrança um pouco do muito que eu te quis…

Onde você estiver não se esqueça se mim”

Para quem não me conhece saiba que um dia eu já risquei o salão. Infelizmente a vida tumultuada e os dias corridos me afastaram de algo que era muito prazeroso para mim:  A dança de salão.

Mas esse texto agora não é sobre mim, e sim sobre Otília.

Otília, 65 anos, viúva há 15 anos, começou a frequentar os bailes de dança de salão por estar se sentindo solitária após a viuvez e queria formar novos ciclos de amigos.

Coincidentemente, estávamos na mesma festa de aniversário, que estava sendo comemorada num baile de dança de salão.

Subitamente meus pensamentos foram interrompidos pela neta de Otília que me pediu:

“Será que você pode aconselhar minha avó?”

Respondi:

“Vou tentar.”

Otília começou a me contar que era viúva há 15 anos e sinceramente nunca mais havia pensado em ter um amor ou se relacionar sexualmente. Não tinha nenhum motivo para isso, a não ser o fato de já ter vivido um grande amor. Segundo ela, Antônio tinha sido o grande amor de sua vida.

 Eles tinham sido super felizes combinavam em tudo: viagens, nos pensamentos em relação à criação dos filhos, e o sexo era incrível. Sentia-se completa ao lado dele, mas foi pega de surpresa pelo seu falecimento. Ficou num vazio sem fim por semanas, meses anos.

Até que a vida precisou ser retomada.

Recentemente, num desses bailes da vida, Otília conheceu Hélio.

Hélio 10 anos mais jovem, viúvo, sorridente, cheio de vida, se aproximou de Otília pois seus netos haviam iniciado um romance.

Trocavam mensagens no WhatsApp do grupo de dança e marcavam saídas em grupo para os bailes da vida.

Um dia Hélio resolveu fazer uma reunião em sua casa, foi a primeira vez que ele e Otília realmente conversaram, falaram sobre netos, viagens e sobre a viuvez.

Desde esse dia Hélio passou a mandar mensagens no privado para Otília.

Até que um dia ele combinou um novo evento em seu apartamento.

Nessa noite toda vez que alguém saia, Hélio olhava para Otília e falava:

-“Fique mais um pouco”

E assim ela foi ficando até ser a última.

Tomaram mais uma taça de vinho e quando Otília levantou se para se despedir Hélio a beijou.

Ela ficou completamente desconcertada, nunca mais havia se relacionado com ninguém.

Ficou tão constrangida que sem grandes explicações pediu para ir embora.

Preferiu não ir mais aos bailes e por um tempo não respondia mais as mensagens no grupo e tampouco no privado…

Preferiu esquecer, ou melhor, tentar esquecer aquele beijo.

Sentia-se estranha, pois mesmo estando viúva sentia que estava traindo seu marido.

Um dia viu uma mensagem no grupo a respeito de uma reunião na casa de Hélio e resolveu aparecer.

Quando chegou ele sorriu surpreso, tentaram várias vezes conversar, mas sempre eram interrompidos. Dessa vez ele não precisou pedir para ela ficar, ela que resolveu ir ficando.

No momento que ficaram sozinhos Otília se aproximou e disse:

“Eu ainda sou apaixonada pelo meu marido…”

Hélio respondeu:

“Eu entendo, mas ele morreu e eu estou aqui agora.”

Ela respondeu:

“Eu não sei nem por onde começar, nunca estive com outro homem a não ser com ele”

Hélio sorriu e disse:

“Eu te mostro. E a beijou.”

Novamente Otília ficou nervosa e fugiu…

Desde esse dia Hélio não a tem procurado. Ela queria falar com ele, estar com ele, mas não sabia como recomeçar…

Ahhh Otília, começos são excitantes, mas quem disse que recomeços também não podem ser?

Recomeçar assusta, dá medo, mas isso não pode nos impedir de arriscar.

Use o tempo a seu favor, não tenha pressa.

Imagine que esse recomeço seja que nem uma aula de dança de salão para iniciantes, alguns passos você vai acertar, outros você vai errar, até que aprenda a fazê-los de forma correta. O importante é não desistir das aulas e tentar acompanhar a turma.

Otília sorriu.

Enquanto eu me levantava para ir embora, escutei alguém falando:

“Olha lá! O Hélio veio e tirou Otília para dançar.”

Reparei que eles estavam “riscando o salão”, alguns passos estavam certos , outros errados, mas eu tinha certeza que já já eles aceitariam o ritmo da dança.

Dra Ana Dias

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